por Sabrina Vianna

Se me perguntam o que acho sobre concursos de beleza, respondo que tenho ressalvas. Daí surgem questionamentos: “Então, qual a importância da miss universo 2019 ser negra?”.
Respondo: REPRESENTATIVIDADE.
Se você que lê esse texto tem mais de 30 anos, com certeza cresceu com representações do que é belo através de filmes da sessão da tarde; outdoors; fotos das revistas… Resumindo: pelos meios de comunicação tradicionais, já que a “dona internet”, como costumo carinhosamente chamar, ainda não era nem o cheiro do que é hoje. No tempo em que tudo era analógico e se recebiam cartões de natal pelos correios, as coisas eram assim.
A criança que fui, em idos dos anos 90, sonhava em se parecer fisicamente com Meg Ryan. Aquela atriz loira, de olhos claros e pele alva, que fez várias comédias românticas de sucesso e sempre feliz para sempre com aquele cara alto e branco como normalmente era o que devíamos esperar de perfis de caras “ideais”.
Crescemos sem referências. Sem algo para nos espelhar e nos representar. Nas prateleiras de brinquedos, sempre bonecas brancas. Nas revistas que retratam pessoas de sucesso, pasmem: brancas! Claro que alguém pode dizer, “mas e fulano negro? “Daí também questiono: “No Brasil existe uma ou outra pessoa negra?”, quando se menciona os negros como minorias, nos referimos ao racismo institucional incrustado em nossa sociedade, entretanto somos mais de 50% da população brasileira segundo o IBGE.
Espero que em 2020 encontremos com mais “facilidade” bonecas negras nas prateleiras. Coloco entre aspas a palavra facilidade pois ainda é comum entrar em grandes lojas e não existir nenhuma boneca negra. E nem preciso dizer da ausência de bonecas que representam crianças com necessidades especiais.
Ao entrar em uma loja de departamentos me deparei com a seguinte cena: uma menina entre 7 e 8 anos de idade correu despreocupadamente entre os corredores da loja. Em meio aos olhares de reprovação dos funcionários da loja (afinal não é legal correr pois a criança pode se machucar), ela carregava no alto uma caixa que devia ter um tesouro dentro ou algum liquido mágico; tamanho o cuidado dedicado pela criança para que a caixa não sofresse danos. Ao chegar perto da mãe, observei por cima do ombro, que se tratava de uma boneca negra.
“Mãe essa boneca é igual a Miss Universo!” Meu coração estremeceu ao ouvir essas palavras … a criança dentro de mim queria ter tido uma Zozibini Tunzi, como miss universo, em sua infância, para que pudesse ter “licença” pra me sentir parte de algo, para não precisar me anular e desejar ser “Meg Ryan”, ser alguém que nunca seria eu!
Os conceitos de concursos de beleza ainda não dialogam com o que penso sobre ser bela! Entretanto, a vitória de uma negra como Miss Universo é simplesmente um alento para a auto estima de crianças que agora se enxergam em uma referência de beleza universal.
E nesse dia aquela criança saiu com a boneca que sua mãe comprou que era igual a Miss Universo. E nem era natal.
SABRINA VIANNA é atriz, diretora, produtora cultural e integrante da setorial de cultura afro do Vale do Itajaí/SC
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