por Cláudia de Marchi

No último domingo, para comemorar o seu aniversário de 40 anos, a escritora e roteirista Antonia Pellegrino, que já foi premiada pela Academia Brasileira de Letras e Academia do Cinema Brasileiro, levou seu marido, o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL/RJ) para uma diária no Copacabana Palace.
Os pobres de direita, em sua maioria ignorantes e cheios de ódio, juntamente com o decadente Rodrigo Constantino, resolveram, no decurso da semana, ao ver a foto do casal, atacar o deputado chamando-lhe de“esquerda caviar”, hipócrita, dentre outros termos desarrazoados e tolos. Enfim, tudo se reproduziu num mar de ignorância tal que, resolvi falar a respeito da forma mais didática possível dentro desse universo de ódio permeado pelos gritos dos idiotas através da internet. Gritos estes que fazem eco em qualquer cabeça vazia que esteja em suas cercanias.
Antonia, esposa de Freixo, ao afirmar que foi ela quem pagou a diária, apontou o machismo da dedução dos incautos imersos em cólera e, também, disse que ela é progressista e, ao contrário da elite do atraso e da classe média medíocre, quer dividir riquezas e não migalhas.
Todavia, independente de quem tenha pagado a conta do hotel e, tenho plena certeza que foi ela, o salário do deputado pertence a ele. Ele não está “sequestrando” valores dos cofres públicos. Você, prezado cidadão, tem o direito de achar o valor da remuneração dos políticos demasiado alto e etc., todavia, é o salário deles, quer você queira e concorde, quer não. Marcelo Freixo é um parlamentar aguerrido! O que ele faz em seus dias de folga, seja ir comer num Costelão do Cadeg, seja ir comer strogonoff no A Polonesa ou passar o domingo num hotel de luxo junto com a esposa aniversariante, não o faz hipócrita ou menos socialista, até mesmo porque ser socialista não significa dividir pobreza, mas dar a todos iguais oportunidades para que possam obter riquezas e vivenciar suas vidas como bem lhes aprouver. E esse dever de dar oportunidades iguais a todos os cidadãos não é meu, nem da Antonia, nem do Freixo, mas do Estado.
De mais a mais, o injustiçado Marx nunca falou em voto de pobreza, pelo contrário, ele dizia que “se a classe operária tudo produz, a ela tudo pertence” e como tudo, ele quis dizer tudo mesmo, literalmente. Se eu vendo a minha mão de obra e sou remunerada posso comprar o que eu quiser. Se uma roteirista mundialmente famosa e bem sucedida alçou sucesso em sua carreira e, mesmo sendo socialista progressista, tem condições de hospedar-se num hotel de luxo, então ela pode ficar lá, deitada na beira da piscina, olhando o céu e contando seu dinheiro se quiser. Sim, ela pode!
Não existe “esquerda caviar”, companheiro! O que existe são pessoas de famílias abonadas e da elite cultural, como Chico Buarque, por exemplo, que possuem senso de justiça social. Não há necessidade de ter vivenciado a fome e a pobreza para lutar contra elas, basta ter empatia! Da mesma forma que não há necessidade de ter sofrido racismo, para reconhecer a existência do racismo e pegar na mão dos negros para gritar contra a opressão que eles sofrem, não é preciso ser LGBTQ para lutar pela causa, pela igualdade e pela vida da comunidade que é, diariamente, agredida e morta neste país hipócrita que mais pesquisa sobre transexuais em sites pornô, não é preciso ser índio para lutar pela causa indígena e nem mulher para reconhecer que o machismo e a misoginia oprimem e matam diariamente.
Nada pode representar mais a direita xucra, medíocre e cruel brasileira do que esse pensamento tosco de que, por ser de esquerda, a pessoa precisa renunciar a qualquer prazer existente no mundo, independente de ele ter sido “edificado” sob a égide do capitalismo que construiu riquezas à custa do sangue indígena e negro.
Pepe Mujica definiu bem o que significa a filosofia da esquerda na seguinte frase: Mujica: “O que é ser de esquerda? É uma posição filosófica perante à vida, onde a solidariedade prevalece sobre o egoísmo”. Verdade seja dita que a celeuma direita versus esquerda, no Brasil, não estava tão em voga há alguns anos, antes de parte considerável da imprensa e jornalistas resolverem colocar a culpa por todos os erros da administração pública no único partido de esquerda que governou o Brasil por míseros 13 anos.
Enfim, Karl Marx foi um filósofo e suas ideias deram origem ao marxismo. Ele nunca disse que os trabalhadores deveriam entregar-se à pobreza, pelo contrário, ele queria a riqueza de todos. Utópico ou não, era esse o sumo das ideias do barbudo e, abster-se de luxos tem mais a cara de hippies e franciscanos do que de socialistas.
Ora, ora! O cara que fez voto de pobreza se chama Giovanni di Pietro di Bernardone, mais conhecido como São Francisco de Assis que, depois de uma “juventude irrequieta e mundana, voltou-se para uma vida religiosa de completa pobreza, fundando a ordem mendicante dos Frades Menores, mais conhecidos como Franciscanos, que renovaram o Catolicismo de seu tempo.”[1] Entenderam? Os franciscanos se abstiveram dos bens materiais optando pela mendicância, não os marxistas.
Ah, falando em crenças religiosas, trago à baila o episódio da mitologia bíblica em que Jesus fala a um jovem rico que lhe procurou pedindo conselhos do acerca do que seria necessário para entrar no reino dos céus: “Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me.” (Mateus 19:21). Cristo sugeriu a um rico que vendesse o que tinha, não foi Marx quem disse isso.
É truque velho da direita burra deste país gerar notícias falsas e acusar políticos comunistas e socialistas de estarem usufruindo algo belo ou bom: “A comunista Manuela está na praia, curtindo o ‘bem bom’…”; “Sicrano foi às compras em shopping de luxo” e etc.. Como se o oceano e as praias fossem criações do capitalismo direcionadas exclusivamente aos donos do capital e seus capachos pobres de direita, como se um congressista ou uma congressista de qualquer partido de esquerda não pudessem comprar suas roupas, inclusive ternos e tailler, em lojas de grife.
Essa psicose antiesquerdista vem sendo fomentada pelo atual presidente desde antes de sua campanha e (miserável) eleição. Ele e seus apoiadores nunca leram Karl Marx, pouco ou nada sabem acerca de políticas publicas em beneficio da população adotadas nos Estados de Bem Estar Social, como Noruega, Suécia, Finlândia e Dinamarca e insistem em bostejar asneiras contra quem se opõe as suas políticas neoliberais de Estado Mínimo. E se opõem por quê? Porque a maioria do povo brasileiro não tem condições de pagar plano de saúde privado, assistência médico-hospitalar particular, creches, escolas e universidades privadas e, para que a desigualdade social não aniquile com o Brasil, pugna-se por um Estado ativo na busca pela redução de toda sorte de desigualdades.
Inclusive, estes são objetivos da nossa República inseridos na Constituição Federal/88 pelo constituinte originário:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II – garantir o desenvolvimento nacional;
III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Para além da fofoca “deputado socialista é fotografado em hotel de luxo no Rio”, para além do machismo na “desconsideração” da mulher bem sucedida com a qual o cidadão é casado e que estava lá, linda, bela e feliz, sentada próxima ao marido na piscina do Copacabana Palace, para além da vergonha que é a desocupação de quem perde tempo tentando ofender um político aguerrido na luta pelos direitos do povo, é preciso que as pessoas se conscientizem que lutar pela redução das desigualdades e desejar um mundo mais igualitário não é sinônimo de comunismo e socialismo, mas de empatia, caráter e racionalidade. Da mesma forma que, socialismo e comunismo, atualmente, em nenhum lugar do mundo, se coaduna com ditadura, guerrilhas e mortes. Quem fala o oposto é esquizofrênico ou sofre de algum outro problema psiquiátrico aliado a desvio de caráter, como o atual presidente do Brasil.
Enfim, essa “luta” esquizóide contra um comunismo imaginário é apenas uma ideia reacionária e descontextualizada que um bando de néscios insiste em repassar ao seu eleitorado inculto e maldoso que não lê, não estuda, não se informa, apenas reproduz asneiras temperadas com doses cavalares de ódio e intolerância.
Vejamos que qualquer ditadura, seja ela de esquerda ou de direita, é perniciosa, pois restringe direitos humanos e sociais fundamentais. Não é isso que a esquerda brasileira quer. Nunca foi, não à toa vivemos quase duas décadas de um governo que respeitou a liberdade de imprensa e nunca precisou concitar as Forças Armadas para “defender-se” de manifestantes descontentes. O começo de qualquer ditadura reside no silenciamento da imprensa, na restrição a liberdade de expressão e cultural, na ausência de diálogo com os oponentes e na perpetuação do ódio contra quem está do outro lado. É assim que uma democracia, notoriamente frágil, se afunda e esse é o perigo que nos ronda a cada dia desde meados de 2016, mas, agora, mostra-se como uma quase realidade. Coloco aqui a palavra “quase”, porque em nome da minha sanidade mental, preciso de uma dose de negação para dourar a pílula da desgraça.
CLÁUDIA DE MARCHI é advogada e acompanhante de luxo
[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/Francisco_de_Assis
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