por Claudia de Marchi
Precisamos falar das mulheres e homens que se erigem contra preconceitos, desde que não sejam os seus. Desde que mudei de carreira, ou melhor, “agreguei” uma nova profissão ao meu sustento, cansei de ler críticas de feministas e do povo de esquerda à minha concepção de feminismo, liberdade e etc.. Li ofensas nos comentários do G1, do Catraca Livre, da Folha de SP e do Uol. Nunca me manifestei, porque me sentia bem demais para desperdiçar meu tempo com aquelas “pessoas”. O mal da nossa sociedade é a generalização. É julgar a Cláudia de Marchi como sendo mais uma acompanhante/prostituta e toda acompanhante/prostituta como se fosse a Cláudia de Marchi.
A superficialidade com que, até as pessoas que se consideram “cultas e inteligentes” julgaram e julgam a minha vida é imensurável! Falo da minha vida, porque foi “ela” que virou notícia e esteve dentre as mais lidas em sites entre 2016 e o início deste ano. A questão é que, assim como as feministas “não veem” feminismo em fazer sexo e lucrar com isso, eu não vejo feminismo em várias condutas de feministas (sair à noite para procurar alguém pra transar, esperar ligação no dia seguinte, deixar o cabelo assim e o corpo “assado”, porque homem gosta, transar sem vontade com o marido por medo de traição ou de frustra-lo, valer-se da liberdade para aumentar o decote, ajustar larguras e encurtar saias, manter casamento sem paixão e etc.).
Todavia, eu nunca fui às pages da mulherada critica-las, simplesmente porque, se o feminismo, os direitos fundamentais e, enfim, a igualdade e liberdade existem, é para cada pessoa ser livre fazendo o que quer! Ontem eu conversava com um cliente sobre essas jovens afoitas por dinheiro que querem dicas minhas e sobre as mulheres que precisam de dinheiro e veem na prostituição a sua única solução na vida. Ora, se você está numa posição tal em que uma coisa (seja ela qual for) lhe parece ser a sua única opção, então essa coisa não é opção! Dívidas? Miséria? Não pague as primeiras e corra atrás de ajuda para não passar fome, mas nunca faça algo apenas por dinheiro. Seja o que for. Agir em desespero e pelo vil metal acaba vilipendiando a sua dignidade, o seu amor próprio e o seu valor.
Eu estou aqui porque, diante de muitas coisas que vivi, optei por isso. Mas eu não “sou isso”. Assim como não “sou” a doutora Cláudia. Não “sou” a professora Cláudia. Não “sou” a ex-sócia dos fulanos, a ex-esposa de sicrano, a ex-namorada ou a ex-noiva de beltrano. Não “sou” a cronista, não “sou” a escritora. Eu sou uma alma livre e intensa e só isso me define.
A minha carreira como cortesã é atípica, não apenas pela minha idade, pela mudança abrupta de “meio profissional”, mas pela forma com que me imponho, pela seletividade que tenho, pela coragem em dizer para um homem que não gostei do seu beijo e não prosseguirei com o encontro, porque não faço nada sem tesão (nunca fiz e nunca farei!), enfim, eu quebro qualquer paradigma dentro do fórum, na Academia e na sociedade patriarcal e isso, infelizmente, incomoda até as mulheres que deveriam pensar e dizer: “Ela é livre e vive como deseja”, ao invés de, sem saber nada sobre mim, dizer coisas como “nem é gente quem acha que sexo por dinheiro é “empoderador”. Eu sou gente e não acho que o amor romântico seja empoderador, não acho que sexo casual seja empoderador, não acho que procurar uma “metade da laranja” seja empoderador e, de mais a mais, profissionalizar algo de que gosto muito foi uma manifestação do meu empoderamento, não a causa dele.
Eu já fui muito machista, recalcada, conservadora, medíocre, careta e tola até chegar à maturidade atual, logo, se o meu empoderamento avilta ou irrita o seu “espírito” esquerdista, feminista ou conservador e sexista, você precisa rever seus conceitos, procurar um terapeuta, olhar o seu próprio umbigo, porque há algo muito errado com você! Com você, não comigo, que nada sei ou pretendo saber a seu respeito. Que não lhe critico ou ofendo, mesmo que meu cérebro exerça, ainda que rara e superficialmente, o direito que possui de lhe achar frívola, afinal, eu não sou hipócrita em negar que eventualmente eu posso julgar mal o que ou quem, à primeira (e seguidamente enganosa) vista, eu acho estúpido, mas eu não procuro discussões dentro ou fora da internet, porque o meu julgamento e pensamento, são apenas o meu julgamento e o meu pensamento, ou seja: são tão ínfimos quanto um grão de areia na “ordem” do seu dia e da sua vida que, deduzo, deve ser feliz, do contrário, você a mudaria, como eu mudei a minha e, logo mais ali adiante, mudarei novamente, porque se tem algo que eu amo neste mundo, este algo se chama “mudar”!
Se eu serei julgada pelo que fiz nos últimos anos e farei até EU resolver mudar? Deduzo que sim. Mas eu nasci mulher, não sou a Geni e nunca tive as predileções dela, mas sou mulher nesta sociedade que adora nos jogar pedras. Eu me acostumei a ser julgada: “Filha única? Mimada!”. “Filha de caminhoneiro em colégio particular? Ridícula!”. “Musculosa? Cavalona!”. “Magra? Saco de ossos.”. “Não gosta da própria aparência? Problemática!”. “Se ama e se gosta? Convencida, arrogante!”. “Se cala? Servil!”. “Exige respeito? Grossa!”. “Namorado mais velho? Interesseira!”. “Namorado rico? Vadia”. “Transou no segundo ou primeiro encontro? Puta.” “Não transou depois de meses? Tá se ‘fazendo’.” “Brava? Mal amada!”. “Extrovertida? Atirada!”. “Discreta? Antipática”. “Abstemia? Chata!”. “Alcoolizada? Bebum!”. “Quer casar e ter filhos? Iludida!”. “Não quer parir? Pessoa má, pois filho é uma ‘bença'”. “Tirou nota boa, foi orientanda do fulano? Transou com o professor!”. “Bonita e trabalhando com o ‘Doutor’ Fulano? Tá ‘dando’ pra ele!”. “Bonita e inteligente? Deve ser frígida, azeda e ter TPM!”. “Gosta muito de sexo? Ninfomaníaca!”. “Se internou num hospital psiquiátrico por estresse e cansaço com a vida? Louca!”.
“Perdoou o fulano? Reatou? Otária, não se valoriza!”. “Se divorciou? Não sabe ceder, lutar pela relação!”. “Sai em balada? Tá caçando macho!”. “Não gosta de sair? Antissocial!” e a lista segue e nunca terá fim! Ou seja: na arte de ser julgada equivocadamente eu sou mestra, todavia se a opinião alheia me interessasse eu não seria eu! Mas, felizmente eu sou eu e estou aqui para dizer que a melhor “posição” que você pode ousar, no sexo e fora dele, é aquela que lhe dá prazer e isso é muito pessoal, assim como opinião: é sua, guarde para si e reveja sempre os seus conceitos, porque preconceito, inteligência e língua afiada nunca andaram e nunca andarão juntos. Eu tento me desfazer dos meus com autocrítica, diariamente. Tente fazer o mesmo, a humanidade e eu agradecemos.
CLÁUDIA DE MARCHI é advogada e acompanhante de luxo. Mais sobre a autora no site http://www.claudiademarchi.com.br
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