por Veyzon Campos Muniz

A busca pelo sentido das coisas, muitas vezes, surge de uma inquietação existencial. Quando tratamos de conceitos jurídicos, contudo, esse mal-estar, não raro, conecta-se com nossa própria constituição ontológica.
Em que pese diversos livros, periódicos e artigos, especialmente aqueles filiados a doutrinas estadunidenses (como p.ex. a Teoria Racial Crítica e certos Estudos de Gênero), e materiais decorrentes, utilizem termos como “hipossuficientes”, “minorias” e “vulneráveis” para se referir a determinados indivíduos e coletividades sociais, tais como: população negra, povos indígenas, mulheres e pessoas queer ou em situação de rua, é importante ter em conta que o sentido das palavras (adjetivação) e sua aplicação sociocultural têm um grande potencial de construção de narrativas, formulação de conhecimentos e transformação de realidades.
Não se pode desassociar a “força” das palavras de suas repercussões fáticas e, igualmente, não se pode ignorar a sociedade em que elas são utilizadas. Um ótimo exemplo é o termo “menor”, hoje obsoleto no Brasil, para se referir a crianças e adolescentes, pessoas em desenvolvimento, que nada possuem de inferior a outras pessoas com maior idade.
Nesse mesmo sentido, em nada contribui ao entendimento, acolhimento e intervenção na vida de pessoas vulnerabilizadas por sistemas de opressão e exclusão serem tidas como menos suficientes em relações diversas – “hipossuficientes” –, como representativas de menor contingente populacional (o que nem é um fato verificável) – “minorias” –, ou como qualitativamente vulneráveis (o que nunca deve ser um estado permanente). Logo, identificar pessoas e grupos vulnerabilizados como tal não é um mero preciosismo, é um ato de reconhecimento de um estado de coisas que urge de mudança – que começa, justamente, por se enxergar tais pessoas e grupos como são.
Ou, em outros termos, é inadiável que se oriente a semiótica à prática de direitos humanos. Sobretudo, quando o seu observador-realizador é um ser-pesquisador preto.
VEYZON CAMPOS MUNIZ é doutorando em Direito Público (Universidade de Coimbra) e mestre em Direito (PUCRS)
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