por Gabriel Lepeck

A hegemonia de um grupo dominante não se constitui pela demonstração de seu poder de forma autoritária, mas sim, pela capacidade de unificar em torno do seu projeto blocos sociais com concepções diferentes, que por influências ou falta de consciência crítica, trabalhariam em favor dessa classe hegemônica.
Essa concepção de hegemonia é ligada a Gramsci e sua noção de Estado Ampliado. Porém, antes do pensador italiano, várias sociedades já haviam convivido com estruturações semelhantes.
No Alto Império Romano, período que historicamente vai de 27 a.C até o século 3 d.C, a sociedade era dividida em três classes: a Senatorial, aqueles que tinham poderes políticos e obtinham regalias; a Equestre, os comerciantes e a nobreza que acessavam os cargos públicos; e a Plebe, maioria da população, composta por camponeses e trabalhadores.
Esse modelo foi arquitetado para apaziguar a classe aristocrata que formava o senado e havia perdido influência com a ascensão do imperador. Entretanto, um problema maior surgiu, o grupo social mais avolumado era o que detinha menos direitos. Mesmo assim, a Plebe tinha grande importância para o imperador, afinal, ela era maioria. Assim, uma revolta dos camponeses poderia levar ao colapso interno do Império Romano.
Foi nesse contexto que surgiu o Panem et Circenses – o Pão e Circo – uma das estratégias de manutenção de hegemonia mais conhecidas de toda a história ocidental.
O Pão e Circo consistia na distribuição de alimentos (pão) e na realização de espetáculos (circo) para entreter e acalmar a Plebe. Os grandes banquetes públicos, assim como corridas de cavalos e disputa de gladiadores no Coliseu, eram comuns durante o Alto Império. Todos esses eventos faziam com que o Imperador mantivesse, ao modo descrito por Gramsci, outros grupos sociais trabalhando para manter a hegemonia de seu reinado.
Com o tempo esse modelo político se tornou insustentável devido à queda do comércio romano, que não sustentava mais o custo dos espetáculos e também pela crítica e desinteresse na violência que compunha os espetáculos.
Na contemporaneidade não existe mais um único “imperador”, pois além do Império/Estado, existem outras superorganizações que são dotadas de poder para exercer hegemonia e entregar falsas conquistas para classes dominadas. Sindicatos, partidos políticos, empresas e instituições de ensino são apenas exemplos de tais organizações.
Ao ser contratado por uma empresa, o funcionário busca receber um salário compatível com a função, além de ter boas condições de trabalho e direitos respeitados.
No entanto, o que se nota é que, para mascarar essas expectativas, frustradas com baixos salários, horas extras não remuneradas e pressão por resultados, as empresas buscam cada vez mais oferecer pão e circo, ao melhor estilo romano. Assim, confraternizações, sofás confortáveis e liberdade para pets são algumas das estratégias maquiavélicas adotadas.
Com instituições de ensino isso é ainda mais assustador. Quando alguém ingressa na faculdade, pressupõe que irá adquirir conhecimento e desenvolver um senso crítico. Entretanto, não é isso que acontece. O que se vê são aulas ocupadas em divertir, presentinhos para os acadêmicos e promoções mais ocupadas em manter o cliente do que ensinar o aluno.
Essas estratégias, na empresa e na universidade, apesar de deixarem o ambiente mais descontraído, buscam ocultar do empregado as ilegalidades e do aluno a defasagem do ensino.
Esse é o Pão e Circo contemporâneo. Novamente mantendo hegemonias e tentando acalmar as massas.
GABRIEL LEPECK é publicitário e graduado em comunicação social (UNIFEBE)
Categorias:ARTIGOS
Boa análise! É muito perversa a lógica que substitui a produção de conhecimento pela produção de conteúdo, abissalmente diferentes, entrando com tudo em algumas instituições de ensino superior.
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