por José Ernani Almeida

Foi no 10 de fevereiro de 1756, há 264 anos, que os exércitos coligados de Portugal e Espanha tiveram o enfrentamento decisivo com as forças guaranis, no contexto das Guerras Guaraníticas, nos campos de Caiboaté. Três dias antes os índios haviam perdido seu grande líder, Sepé Tiarajú, que tombara na chamada Sanga do Bica, na região de São Gabriel/RS.
Como narra o historiador Tau Golin, em seu livro “A Guerra Guaranítica”, “do lado dos exércitos coligados, com a preparação para entrar em batalha, o dia era tenso. A marcha começou por volta das 5h30 do dia 10 de fevereiro. (…) Como algo jamais visto, numa prolongada e minunciosa operação, durante duas horas os aproximadamente 4 mil homens evoluíram para suas posições”.
“(…)A batalha foi iniciada pela artilharia. Os canhões dispararam duramente em toda a linha da trincheira e no capão de sua retaguarda. Quando a confusão estabeleceu-se nas tropas missioneiras, a infantaria avançou diretamente ao inimigo, com as linhas atirando intermitentemente, até consumar o assalto à trincheira pelos granadeiros e fuzileiros, enquanto as duas cavalarias realizaram os movimentos de envolvimentos pelos flancos”.
O historiador enfatiza que “destacou-se pela primeira vez em tal dimensão militar a função preponderante da infantaria na pampa, colocando-se como arma estratégica superior e decisiva. No avanço contínuo das linhas, dispararam de forma intermitente contra os indígenas estáticos em trincheiras improvisadas, até destroçá-los”.
O pampa foi empapado de sangue. Chacinaram 1,5 mil guaranis em menos de duas horas. Tau Golin relata: “Os missioneiros foram dizimados, em uma das maiores carnificinas da época colonial. Independente dos desencontros estatísticos, as cifras dos mortos foram elevadas em um momento específico da ‘batalha’, produzidas em fase em que a derrota dos missioneiros encontrava-se consumada e eles se rendiam”.
(…) “Conforme documentação da época, o comando luso-espanhol perdeu o controle sobre a gauchada, responsabilizada, em parte, pela ‘mortandade’. Esses ‘paisanos’ e ‘blandengues’ prosseguiram com as execuções após os índios terem sido completamente derrotados e pedirem clemência”.
Já, segundo Tau Golin, “as baixas dos aliados eram pífias. Três espanhóis morreram e dez ficaram feridos. Entre os lusos, somente uma morte e trinta feridos. A infantaria luso-brasileira havia sido dizimadora”.
Assim que a chacina de Caiboaté chegou aos mais recônditos domínios dos monarcas de Espanha e Portugal, foi comemorada pelos colonizadores com festas e missas, especialmente em Buenos Aires, Colônia do Sacramento, Montevidéu e Rio Grande. O povo missioneiro estava destruído.
Quando hoje ouvimos o atual Presidente afirmar que “os índios precisam ficar cada vez mais parecidos com os brancos”, e vemos suas terras serem entregues à sanha de mineradoras e do agronegócio, chegamos a conclusão que quase três séculos depois, continua o massacre.
JOSÉ ERNANI ALMEIDA é professor de história do Brasil e especialista em história pela UPF/RS
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