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História estética da vulva

por Virginie Larousse

Refazer os seios, o nariz ou retocar a forma das pálpebras. As práticas de cirurgia e de medicina estética no rosto e no corpo são difundidas há décadas, enquanto o uso dessas técnicas na esfera genital feminina – chamado pudicamente de «cirurgia íntima» – ainda é menos publicizado. Isso não significa que não esteja em plena expansão. Amplificação do ponto G, rejuvenescimento vaginal com injeções de ácido hialurônico, vaginoplastia para tonificar os músculos da parede vaginal, redução do capuz clitoridiano para aumentar o prazer sexual, himenoplastia para reconstruir o hímen (muitas vezes em nome de preceitos religiosos ou culturais ligados à virgindade), labioplastia para reduzir os pequenos lábios quando considerados grandes demais: as mulheres podem escolher entre um grande número de intervenções médicas, com ou sem bisturi.

Também na França essas práticas se difundiram (em 2022, as labioplastias chegaram a quase quatro mil, embora o número provavelmente seja subestimado), mas o fenômeno é muito mais amplo nos Estados Unidos, onde começou já nos anos oitenta. No país existem vaginal centers e vulva spa que oferecem banhos de vapor vaginais e vagacials (termo que une vagina e facial tratamento visual), enquanto cirurgiões especializados se apresentam como vulvar designer. O doutor David Matlock é considerado pioneiro no campo depois de fundar, em 1996 em Los Angeles, o Laser Vaginal Rejuvenation Institute (Instituto para o Rejuvenescimento Vaginal a Laser).

Se hoje é possível embelezar os próprios genitais, por milênios a vulva foi vista como algo repelente ou até inquietante. Segundo o pai da psicanálise Sigmund Freud (1856-1939), «o aparelho genital permanece próximo à cloaca» e «na mulher é apenas emprestado dela»; para o intelectual Jean-Paul Sartre (1905-1980), «a obscenidade do sexo feminino é a de tudo aquilo que está escancarado»; o filósofo francês Alain Roger (nascido em 1936) observa que desde a Antiguidade a vulva é vista como «suja, peluda, pegajosa», razão pela qual aparece pouco nas obras de arte, ao contrário do pênis.

«A vulva incomoda, mas nem sempre foi assim», afirma Christian-Georges Schwentzel, professor de história antiga da Universidade da Lorena, em artigo de 2019 publicado no site The Conversation. Na pré-história o triângulo púbico era frequentemente representado, como se pode ver no sítio arqueológico de La Ferrassie, no sudoeste da França, ou na caverna Chauvet, em Ardèche. A Vênus de Monpazier, encontrada na Dordonha e datada de cerca de 28 mil anos atrás, mostra uma mulher com uma vulva enorme, uma espécie de hipérbole da fertilidade feminina.

Na Antiguidade, o sexo feminino continuou a ser valorizado, em particular na Mesopotâmia, onde a deusa Ishtar dizia ao rei seu amante: «Ara, pois, a minha vulva, homem do meu coração!».

«Na Grécia e posteriormente no mundo romano», observa o historiador, «a vulva começa a ser desprezada». As deusas aparecem cada vez mais vestidas e na literatura latina surgem «figuras de ninfomaníacas, apresentadas como mulheres completamente dominadas por seus órgãos sexuais sem freios». Um exemplo é a imperatriz Messalina, da insaciável «vulva túrgida».

Essa ocultação continuou, salvo raras exceções, por séculos. Quando Gustave Courbet apresentou em 1866 o quadro A origem do mundo, que retrata de perto o sexo de uma mulher deitada de pernas abertas, a obra foi considerada obscena.

«O horror suscitado pelo sexo feminino atravessa a história das representações das mulheres desde as origens até hoje», sintetiza a psicóloga clínica e psicanalista Sara Piazza, autora em 2024 da tese Nymphoplastie. Coupez ce sexe que je ne saurais voir (Labioplastia. Cortem este sexo que não posso ver). O sexo feminino, observa a especialista, «assusta porque é considerado devorador, insaciável, próximo à natureza e à animalidade, com uma capacidade ilimitada de prazer que colocaria em risco o homem e seu pênis, ou até mesmo a prole».

Por isso, durante muito tempo, a visão da vulva foi censurada até mesmo na medicina, onde a ginecologia se contentava em examinar apenas o interior do sexo feminino. «A vulva é sempre representada em perspectiva superior, jamais de frente, e sobretudo nunca aberta», observa Sara Piazza. Até os anos 1980, os tratados de ginecologia «mostravam apenas desenhos de vaginas».

O tabu é tanto que a vulva é objeto de escárnio. «Os jovens são constantemente expostos a piadas sobre vulvas que supostamente seriam malcheirosas, repugnantes e deformadas», lamenta a socióloga britânica Chloë Julian. «A cada geração, o mesmo sentimento de vergonha é transmitido. Ele influencia fortemente a maneira como as mulheres percebem seus genitais e se percebem a si mesmas.»

Nos anos 2000, a difusão massiva da pornografia online mudou o imaginário coletivo. A padronização das vulvas, geralmente depiladas e com pequenos lábios reduzidos ao mínimo, criou um novo ideal estético. Muitas mulheres que não correspondem a esse modelo passam a considerar seus genitais anormais.

É nesse contexto que a cirurgia estética genital feminina encontra terreno fértil. A labioplastia, em particular, atrai cada vez mais pacientes, mesmo jovens. A Sociedade Internacional de Cirurgiões Plásticos e Estéticos registrou em 2023 quase 300 mil labioplastias no mundo, contra 138 mil em 2016, um aumento de 115%.

«O fenômeno é preocupante», adverte Sara Piazza. «Em primeiro lugar, porque os riscos não são desprezíveis: hemorragias, infecções, redução da sensibilidade sexual. Mas também porque essa medicalização do corpo feminino reforça os estereótipos sexistas que há tanto tempo sufocam as mulheres.»

Ao mesmo tempo, surgem movimentos artísticos e feministas que reivindicam uma revalorização da vulva. Obras de artistas contemporâneas expõem, sem filtros, a diversidade das formas vulvares. Projetos como o «The Great Wall of Vagina», do britânico Jamie McCartney, que moldou centenas de vulvas em gesso, contribuem para libertar os olhares.

Nas redes sociais também proliferam hashtags como #freethenipple ou #freethenippleproject, que convidam a quebrar o tabu dos corpos femininos e da sexualidade. A psicanalista Sara Piazza conclui: «A vulva não deve mais ser objeto de vergonha ou de intervenção corretiva, mas de orgulho e de emancipação».

A retomada desse símbolo passa também por uma mudança de vocabulário. Até pouco tempo atrás, falava-se genericamente de «vagina» para designar tanto o canal vaginal interno quanto a vulva externa, como se esta fosse invisível. Hoje, linguistas e militantes feministas insistem em nomear corretamente cada parte da anatomia genital feminina, para reconhecer sua existência e legitimidade.

Esse movimento de reapropiação cultural se traduz igualmente em iniciativas pedagógicas. Na Alemanha, por exemplo, a educadora de sexualidade Katharina von der Gathen concebeu livros ilustrados para crianças a fim de mostrar a diversidade dos corpos, incluindo os órgãos genitais. Em outros países europeus, oficinas e exposições didáticas apresentam fotografias ou moldes em 3D de vulvas, para normalizar suas variações e reduzir a vergonha.

O discurso médico também começa a evoluir. Algumas sociedades de ginecologia publicaram recomendações para desencorajar as labioplastias realizadas por motivos puramente estéticos, lembrando que a variação da anatomia vulvar é totalmente normal. Outras campanhas visam informar as mulheres sobre os riscos e questionar a pressão cultural que as leva a recorrer a essas cirurgias.

Ainda assim, o mercado da estética genital permanece em franca expansão, sustentado por clínicas privadas e influenciadores digitais que promovem a «harmonização íntima» como um novo padrão de beleza. Paralelamente, marcas de cosméticos lançam produtos de «embelezamento vulvar», como clareadores, perfumes e cremes «rejuvenescedores».

Esse duplo movimento – de padronização estética, por um lado, e de revalorização feminista, por outro – mostra bem como a vulva continua sendo um território de disputa simbólica. Entre a lógica do mercado e a busca por emancipação, ela concentra tensões históricas, culturais e políticas que atravessam a condição feminina.

«Os genitais femininos sempre foram o lugar de projeção das angústias e dos fantasmas da sociedade», resume Sara Piazza. «Hoje, mais do que nunca, eles refletem a ambivalência entre o desejo de controle e o desejo de liberdade.»

Se, durante séculos, a vulva foi ocultada, denegrida ou reduzida ao silêncio, ela se afirma agora como um espaço de expressão, de resistência e de orgulho. Não se trata apenas de anatomia ou estética, mas de identidade e de poder. A diversidade das vulvas, longe de ser um defeito a corrigir, torna-se o emblema da pluralidade das mulheres e de suas histórias.

Para domesticar

Provavelmente por causa dessa dimensão assustadora – ilustrada por mitos como o da «vagina dentata» – a vulva é objeto, desde a Antiguidade, de intervenções estéticas mais ou menos invasivas. Intervenções destinadas a domesticá-la, controlar sua «bestialidade», dar-lhe um caráter cultural, por meio de práticas que vão da depilação à excisão (a ablação parcial ou total dos pequenos lábios, ou até mesmo dos grandes lábios e do clitóris) até a infibulação (a costura dos grandes lábios).

Originária do antigo Egito (não sendo, portanto, uma prática ligada à religião islâmica, como se costuma acreditar), a excisão se difundiu em muitos países africanos, asiáticos e do Oriente Médio. Ritual de passagem para preparar a adolescente à condição de mulher, foi muitas vezes justificada pela necessidade de eliminar aquilo que, no sexo feminino, parecia pertencer a uma dimensão masculina. O clitóris era visto como um pequeno pênis, a ser retirado para permitir que o sexo da mulher fosse plenamente feminino.

No entanto, observa a psicanalista Françoise Couchard no livro L’excision (2003), essa não era «a motivação principal evocada para legitimar a excisão e a infibulação», mas sim «a preocupação em assegurar a virgindade da jovem, praticando a ablação de seus órgãos sexuais e fechando seu sexo aberto».

Práticas desse tipo também existiram na medicina ocidental até o início do século XX. Um tratado de ginecologia em latim do século VI fala de uma intervenção que lembra a excisão, enquanto no Renascimento o cirurgião francês Ambroise Paré descrevia mulheres que se faziam cortar as ninfas (pequenos lábios) hipertrofiadas, uma característica física que, segundo ele, provocaria nas mulheres um apetite sexual desmedido, tornando necessária a operação.

Na entrada «ninfa», a Enciclopédia de Diderot e d’Alembert também faz referência à labioplastia, ou seja, à operação cirúrgica destinada a reduzir o tamanho dos pequenos lábios. No século XIX, alguns médicos recomendavam a cauterização do clitóris com ferro em brasa, ou até mesmo a sua ablação em meninas ou jovens que se masturbavam. «Intervinha-se para controlar o que podia ser considerado uma sexualidade potencialmente desenfreada, um impulso sem limites», explica Sara Piazza.

A pesquisadora compara essas práticas do passado com a cirurgia estética íntima contemporânea. «Hoje são as mulheres que pedem para ser operadas por razões estéticas, já que consideram anormal a anatomia de seu sexo», observa. «Mas essas pacientes, mesmo que não motivadas por preceitos médicos ou religiosos, se inserem em uma história coletiva de representações inconscientes que atribuem um valor negativo ao sexo feminino e o consideram algo sujo.»

A sexóloga Joëlle Mignot, diretora da revista Sexualités Humaines, lembra que «do ponto de vista médico, na anatomia genital não existem critérios estéticos ou normativos. Todos os genitais femininos são diferentes, assim como os masculinos». Ela constata que nesse campo há muita ignorância e que os imaginários coletivos são condicionados por representações padronizadas dos genitais femininos, na maioria das vezes reduzidos a um triângulo púbico riscado por uma fenda, «um sexo fechado, com poucos pelos, que lembra o de uma menina», explica a especialista.

Uma nova normalidade

A normalização da vulva depilada e «lisa» está tão presente que muitas mulheres se surpreendem ao descobrir que os pequenos lábios podem ultrapassar os grandes, ou que podem ser escuros, assimétricos ou enrugados.

«O imaginário coletivo só reconhece como ‘normal’ a vulva infantilizada, pequena, clara, depilada, quase sem saliência», constata Joëlle Mignot. Essa representação, acrescenta, é reforçada por grande parte da pornografia mainstream, que impõe como padrão vulvas uniformes, frequentemente retocadas digitalmente, destinadas a desaparecer atrás do pênis ereto.

Assim, a labioplastia responde menos a uma necessidade médica do que a uma pressão social e cultural que cria, de maneira artificial, um «problema» anatômico. «Essas operações geralmente não partem de um sofrimento real, mas de um desconforto induzido pela comparação com modelos idealizados», observa Sara Piazza. «A medicina, nesse caso, legitima a norma em vez de lembrar a diversidade do real.»

Esse desconforto também é alimentado pelo discurso comercial. Muitos sites de clínicas privadas apresentam imagens «antes/depois» em que a vulva é exibida como um objeto estético, a ser remodelado para se aproximar de um padrão. Alguns catálogos chegam a propor uma classificação visual das vulvas, dividindo-as em «tipos» mais ou menos desejáveis.

Frente a isso, os movimentos feministas insistem na importância da educação sexual para desconstruir os estereótipos. «Mostrar às adolescentes que não existe uma única forma de vulva, mas uma infinita variedade, é um ato político», sublinha a socióloga britânica Chloë Julian.

Reapropriação feminista

Desde os anos 1970, o movimento feminista busca valorizar a vulva como um símbolo de emancipação. Em 1971, a artista Judy Chicago criou a obra Dinner Party, uma instalação monumental que apresenta 39 pratos de cerâmica em forma de vulva, cada um dedicado a uma mulher célebre da história.

Outras artistas contemporâneas seguiram esse caminho, como a fotógrafa britânica Laura Dodsworth, autora do livro Womanhood, que reúne retratos de vulvas acompanhados de depoimentos pessoais, ou ainda o projeto The Vulva Gallery, da ilustradora neerlandesa Hilde Atalanta, que divulga desenhos celebrando a diversidade dos genitais femininos.

«Essas iniciativas artísticas têm um poder pedagógico imenso», explica Sara Piazza. «Elas mostram às mulheres que sua vulva não é vergonhosa nem anormal, mas única e legítima.»

Além da arte, a militância feminista também se manifesta nas ruas. Em 2018, na Islândia, centenas de mulheres desfilaram em Reykjavik com cartazes que exibiam ilustrações de vulvas, denunciando a pressão estética e a censura dos corpos. Na França, coletivos como Gang du Clito usam grafites e colagens urbanas para reivindicar a visibilidade da vulva como emblema político.

Na esfera digital, hashtags como #myvulvaisnormal («minha vulva é normal») encorajam as mulheres a compartilhar fotos e relatos, criando comunidades virtuais de apoio e de libertação.

Da vergonha ao orgulho

Essas mobilizações contribuem para deslocar o olhar coletivo. A vulva, outrora escondida, temida ou ridicularizada, torna-se cada vez mais um lugar de afirmação e de orgulho.

«Quando uma mulher olha sua vulva no espelho e a reconhece como parte de si, sem repulsa, sem desejo de correção, acontece um ato de emancipação», resume Sara Piazza. «Ela retoma o poder sobre o próprio corpo.»

Ainda que a cirurgia estética íntima continue a crescer, em paralelo também cresce um movimento de contracorrente que busca celebrar a diversidade. Entre a pressão do mercado e a resistência feminista, a vulva revela toda a sua força simbólica: território de controle, mas também de libertação.

Depois de séculos de ocultação e desprezo, ela se impõe como um emblema de pluralidade, desejo e vida.

O peso das representações

Na sociedade ocidental contemporânea, o corpo feminino continua sujeito a uma normatização permanente. A vulva é apenas um exemplo dessa pressão estética. «Enquanto o pênis sempre foi representado em sua diversidade, a vulva só aparece padronizada», observa Sara Piazza. «Isso transmite às mulheres a ideia de que seus genitais devem se conformar a um modelo único.»

A mídia e a publicidade reforçam esse estereótipo. Revistas femininas publicam regularmente dossiês sobre cirurgia íntima, apresentando-a como solução para problemas que, muitas vezes, não passam de construções sociais. Sites médicos falam em «embelezamento» da vulva, como se existisse uma forma correta e universal de sexo feminino.

Essa padronização tem consequências psicológicas reais. Muitas adolescentes e jovens adultas sofrem por achar que sua anatomia é anormal. Algumas evitam se despir diante de um parceiro, outras deixam de praticar esportes ou de frequentar piscinas e praias por vergonha do próprio corpo.

«A vulva tornou-se um marcador de autoestima e de identidade para muitas mulheres», afirma a socióloga Chloë Julian. «Aqueles que lucram com a cirurgia íntima exploram justamente essa fragilidade.»

Entre mercado e emancipação

As contradições são evidentes. De um lado, clínicas privadas, influenciadores digitais e um mercado em plena expansão oferecem técnicas para remodelar, clarear ou «rejuvenescer» a vulva, explorando os sentimentos de inadequação. Do outro, artistas, educadores e militantes feministas tentam mostrar a diversidade das anatomias e valorizar a singularidade de cada corpo.

Essa tensão reflete uma disputa cultural mais ampla. «A vulva é um campo de batalha simbólico», resume Sara Piazza. «Ela cristaliza a luta entre a norma patriarcal, que quer controlar e padronizar os corpos, e a emancipação feminista, que afirma a liberdade e a diversidade.»

Nos últimos anos, multiplicaram-se iniciativas para sensibilizar as mulheres sobre os riscos da cirurgia estética íntima e para lembrar que não existe uma vulva «ideal». Associações feministas propõem oficinas de autoconhecimento corporal, enquanto médicos progressistas publicam recomendações para desencorajar operações desnecessárias.

Paralelamente, surgem cada vez mais campanhas públicas que usam humor e ironia para desconstruir os tabus. Em alguns países, desenhos animados e livros infantis já mostram diferentes tipos de vulva, numa tentativa de normalizar a diversidade desde cedo.

Educação e libertação

Várias especialistas insistem que a chave está na educação sexual. «É preciso ensinar, desde cedo, que cada corpo é único e que não existe norma», defende Joëlle Mignot. «O conhecimento da anatomia e da fisiologia ajuda a reduzir a vergonha e a ansiedade que tantas adolescentes carregam.»

Essa pedagogia passa também pela linguagem. Nomear corretamente a vulva, o clitóris, os pequenos e os grandes lábios é uma maneira de reconhecer sua existência. «Quando usamos apenas o termo ‘vagina’ para falar de tudo, apagamos uma parte essencial da sexualidade feminina», observa Sara Piazza.

As redes sociais, apesar de frequentemente reproduzirem estereótipos, também abriram espaço para comunidades que promovem a autoaceitação. Hashtags como #loveyourvulva ou #mybodyisnormal permitem que milhares de mulheres compartilhem fotos, histórias e mensagens de apoio.

«A vergonha só desaparece quando percebemos que não estamos sozinhas», diz Chloë Julian. «Ver a diversidade real é libertador.»

O futuro da vulva

Especialistas acreditam que a batalha em torno da vulva ainda está longe de terminar. De um lado, a indústria médica e estética continuará a propor novas técnicas, explorando as inseguranças femininas. Do outro, movimentos feministas, artistas e educadores seguirão reivindicando a diversidade como valor e a autoaceitação como conquista política.

«O corpo feminino sempre foi um espelho das tensões sociais», lembra Sara Piazza. «A forma como tratamos a vulva revela muito sobre o lugar das mulheres em nossas sociedades.»

Para a psicanalista, a verdadeira emancipação passa por um deslocamento do olhar: deixar de considerar a vulva um problema a corrigir para vê-la como uma expressão da pluralidade humana. «Enquanto se insistir em medir, classificar e corrigir, estaremos perpetuando uma lógica de dominação», afirma.

O desafio, portanto, é cultural. É preciso ensinar que não há um modelo único de beleza e que cada corpo tem direito à sua singularidade. «A diversidade das vulvas é infinita», conclui Joëlle Mignot. «E é exatamente isso que deve ser celebrado.»

Da ocultação ao símbolo

Durante milênios, a vulva foi escondida, ridicularizada ou temida. Hoje, ao mesmo tempo em que o mercado tenta reduzi-la a um padrão estético, movimentos artísticos e feministas a transformam em emblema de emancipação.

Essa ambivalência mostra a força simbólica dos genitais femininos. A vulva continua sendo um espaço de controle, mas também de libertação.

Se outrora foi associada ao pecado, à obscenidade ou à vergonha, agora pode se tornar um sinal de orgulho e de poder. A pluralidade das vulvas reflete a pluralidade das mulheres. E celebrá-las significa, em última instância, reconhecer plenamente a diversidade da condição humana.

Essa compreensão superficial é confirmada pela dramaturga estadunidense Eve Ensler, que em 1996 ficou famosa com a peça Os monólogos da vagina: «Digo vagina porque não consegui encontrar uma palavra mais abrangente, que descreva realmente toda a área e todas as suas partes. […] Vulva é um termo mais válido, mais específico. Mas não creio que a maioria de nós tenha clareza sobre o que a vulva compreende.» O termo, derivado do latim, indica a «matriz» e não é muito explicativo.

Para combater a ignorância, artistas e ativistas feministas lançaram projetos de promoção da diversidade anatômica dos genitais femininos, seguindo o movimento da body positivity. O escultor e fotógrafo Jamie McCartney realizou em 2011 o Great Wall of Vagina, a partir de moldes de quatrocentas vulvas. Em 2013, uma blogueira, Emma, lançou on-line o Large Labia Project, publicando fotos do próprio sexo, caracterizado por pequenos lábios assimétricos que sobressaem dos grandes lábios. Depois dela, centenas de outras mulheres fizeram o mesmo. Em 2019 foi inaugurado em Londres o Museu da Vagina, que combina uma abordagem cultural e científica.

Estereótipos difíceis de morrer

A ciência é em parte responsável pela ignorância em relação à vulva. O clitóris já havia sido identificado em tratados médicos antigos, mas o termo desapareceu dos dicionários e dos textos de anatomia nos anos 1960 do século XX. Só em 1998 a urologista australiana Helen O’Connell publicou um estudo com a primeira ilustração detalhada do órgão. Apesar dos inegáveis esforços pedagógicos para tornar a «zona V» mais conhecida, os estereótipos continuam arraigados. E se fortalecem, talvez sob a influência conjunta da difusão do pornô e das redes sociais, com suas representações polidas dos corpos.

Um estudo sobre as fotos publicadas pela revista Playboy entre 1954 e 2013 mostrou que, ao longo dos anos, a atenção se deslocou dos seios para a esfera genital das mulheres, muitas vezes com retoques destinados a apagar o que é considerado inestético, contribuindo assim para a idealização anatômica do sexo feminino. Do mesmo modo, a difusão em larga escala da depilação púbica integral ou quase, que expõe a vulva, contribui para tornar visíveis suas dobras e saliências, julgadas negativamente em termos estéticos.

Como destaca Sophie Berville, cirurgiã especializada em patologias vulvares, desde os anos 2000 impôs-se em nossas sociedades um modelo de referência da vulva: um púbis glabro, sem pele em excesso, firme, rosa e inodoro. É o que Piazza define como um «sexo Barbie», isto é, reduzido «a uma simples fenda, algo que não existe».

«Por trás desse critério estético», especifica a psicóloga, «há representações ligadas a estereótipos de gênero: o elemento feminino deve ser discreto, doce, disciplinado, reservado. Tudo o que representa um elemento de desordem – lábios excessivos, pelos demais, muitos traços que possam lembrar atributos masculinos – deve ser removido.» E justamente para se aproximar dessa representação idealizada, várias mulheres recorrem à labioplastia.

Piazza se diz preocupada em ver que «o idealizado se torne a norma. Operar mulheres convencidas de ter um sexo anormal, ainda que não exista um padrão do ponto de vista médico, significa criar e consolidar uma norma», lamenta. «As mulheres interiorizam as representações ligadas aos estereótipos de gênero, e a medicina se torna cúmplice de exigências normativas ditadas pelo patriarcado e pelo capitalismo, que pedem às mulheres que sejam sempre jovens, belas e com uma pele perfeita.»

Esses temores explicam a difusão, nos Estados Unidos, a partir dos anos 2000, de um movimento de contestação da cirurgia estética da vulva. Em novembro de 2008, algumas ativistas encenaram, diante do Vaginal Surgery Center de Nova York, o espetáculo teatral Dr Interest Free Financing Available and the Two Vulvas (O doutor Financiamento a Juros Zero e as duas vulvas), que denuncia os excessos comerciais dessas práticas e compara os médicos que realizam essas intervenções, definidas como «mutilações», àqueles que praticam as excisões.

Isso levou Berville a refletir e a colocar seu trabalho em discussão. Hoje, junto com Sara Piazza, ela sempre conversa com as pacientes sobre suas motivações para operar-se. As duas especialistas adotaram um questionário sobre a qualidade de vida sexual, o Female Sexual Function Index (Índice das Funções Sexuais Femininas). Segundo Berville, uma constatação é obrigatória: «Antes da operação, as mulheres muito complexadas com sua anatomia sexual sofrem de transtornos psicológicos e têm uma qualidade de vida sexual muito inferior à média, porque querem evitar a exposição de sua vulva. Depois da operação, a qualidade de sua vida sexual aumenta, porque se sentem à vontade ao fazer amor e em seu corpo». Um efeito muito positivo que, observa a cirurgiã, «a convenceu a superar suas últimas resistências diante dessas operações».

Compreendendo as críticas quanto à criação de uma norma idealizada, Berville observa que «é muito difícil escapar aos cânones sociais. No plano coletivo, é necessário refletir; mas, no plano individual, não cabe a mim decidir no lugar de uma paciente em dificuldade. Mesmo que eu não compartilhe esses cânones». Além disso, acrescenta, «o aspecto ético interessa a qualquer ato estético, mesmo não cirúrgico», como, por exemplo, tingir os cabelos brancos.

Concorda Guillaume Durand, filósofo que trabalha no policlínico de Saint-Nazaire, perto de Nantes, onde dialoga com pessoas que querem submeter-se à cirurgia íntima. Autor de La médecine des désirs (A medicina dos desejos), ele observa que «muito frequentemente a opinião pública percebe esse tipo de demanda como ilegítima, porque o paciente não está realmente doente. Mas a medicina não se ocupa apenas de curar patologias. Basta pensar na anestesia peridural: por décadas os médicos se opuseram, considerando que a dor do parto não era uma doença».

Durand sustenta que os médicos devem «ajudar as pessoas a realizar-se, a serem mais felizes. Se algumas mulheres acham que ficarão mais satisfeitas ao retocar sua anatomia genital, a decisão cabe a elas». Desde que, acrescenta, a relação entre riscos e benefícios tenha sido bem analisada e que a demanda seja «livre e consciente».

Segundo ele, quem contesta essas práticas estéticas insiste justamente nesse último ponto, considerando muitas vezes «com ceticismo» a autonomia das pacientes, apresentando-as como «imaturas, neuróticas ou influenciadas por estereótipos sociais». Em vez disso, na maioria dos casos, «as mulheres já tiveram de lidar com a desaprovação ligada ao fato de recorrer ao bisturi por questões estéticas». Uma reprovação herdada, segundo ele, da filosofia antiga e da «moral judaico-cristã, que encoraja a aceitar-se como se foi criado».

Para Durand, a cirurgia do íntimo suscita todas essas resistências porque o sexo é o órgão tabu por excelência: «Falar de cirurgia sexual provoca emoções muito fortes, uma forma de medo, de receio, todos elementos típicos do tabu. A ideia dominante é que o sexo é sagrado, proibido, e que deve ser tratado de maneira diferente das outras partes do corpo». Uma percepção contra a qual o filósofo luta, favorecendo uma visão neutra do sexo: «A medicina trata os genitais como qualquer outro órgão, sem tabus particulares».

Pode acontecer, porém, que o tabu do sexo feminino se transforme em um totem. Algumas feministas, ressalta a sexóloga Joëlle Mignot, «são muito hábeis em fazer da vulva um instrumento político», a tal ponto que os anglófonos falam em vulvactivism.

Mostrar faz pensar

Exibir de repente a própria vulva provoca tamanho efeito de estupor em quem se encontra na posição de voyeur involuntário que as relações de poder acabam sendo invertidas, tornando as reivindicações muito persuasivas. Foi o que mostrou, em 1968, a artista austríaca Valie Export com a performance Aktionshose: Genitalpanik, quando entrou em um cinema pornô de Munique vestindo uma camisa preta e calças com um buraco no entrepernas que deixava sua vulva à mostra, convidando os espectadores a tocá-la. Todos preferiram abandonar a sala humilhados, porque a artista os havia forçado a confrontar-se com sua violência misógina.

O gesto de exibir a vulva é, na verdade, muito mais antigo. Na mitologia grega, a deusa Deméter, inconsolável pela perda da filha Perséfone, cai no riso quando a criada Baubo ergue a saia para lhe mostrar o sexo nu. O striptease improvisado desperta do torpor a deusa das colheitas, permitindo que a natureza recupere sua fertilidade.

Fala-se também de exibição das partes íntimas, anasyrma em grego, no século VI a.C., quando as mulheres persas levantaram as vestes para convencer os homens a voltar a combater contra os inimigos. Mais recentemente, durante a segunda guerra civil na Libéria (1999-2003), a ativista pelos direitos civis Leymah Gbowee (Prêmio Nobel da Paz em 2011) ameaçou desnudar-se em público em nome da paz.

Nos Estados Unidos, durante as manifestações de 2020 do movimento Black Lives Matter, uma mulher apelidada de Naked Athena (Atena nua) sentou-se nua na rua, abrindo as pernas diante das forças da ordem, que se afastaram rapidamente.

Em 2019, a performer luxemburguesa Deborah de Robertis apresentou-se nua no Parlamento Europeu, acompanhada por outras militantes, para denunciar a ausência de mulheres em posições de poder e a inércia dos políticos diante da crise ecológica e social. «Mostrar o corpo nu», declarou a artista em entrevista à revista Les Inrockuptibles, «pode ter um caráter político. Não é o corpo que é político, e sim a reflexão que dele decorre». Em manifestações como a de 8 de Março em Paris, veem-se regularmente faixas com a inscrição Revulvition.

No ensaio de 1983 Baubo, la vulve mythique (Baubo, a vulva mítica), o antropólogo e psiquiatra Georges Devereux escrevia: «Espero ‘reabilitar’ a vulva e a vagina, cuja importância na experiência individual e na cultura foi sistematicamente obliterada por uma preocupação centrada no órgão masculino».

Depilada ou com sua pelugem natural, distante de modelos de referência ou retocada para senti-la como própria, a vulva – ainda que não escape às modas do momento – parece ter voltado ao centro dos interesses das mulheres, que veem nela uma possibilidade de empowerment, de reconquistar aquele poder que nos lembra como, no princípio, era o V.

Virginie Larousse é formada pela École du Louvre e pela Universidade Paris IV-Sorbonne, Virginie Larousse é historiadora e historiadora da arte por formação. Após atuar como editora-chefe de uma revista acadêmica dedicada às religiões e lecionar história das religiões na Universidade da Borgonha, iniciou sua colaboração com o Le Monde des Religions , do qual se tornou editora-chefe em maio de 2013

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