ARTIGOS

COVID-19 e as joias do infinito na Manopla de Thanos

por Márcia Sarubbi Lippmann

Em meio a pandemia do COVID-19, do grego pandemías, pan, “todo” + demos “povo”,  me encontro tomada por inúmeras reflexões, mas uma imagem não sai da minha cabeça: a cena em que Thanos, um dos vilões da Marvel que faz alusão ao deus da morte Tanatos, consegue a última joia do infinito ( COVID-19) e desencadeia seu processo de extermínio das raças que habitam os mundos.

A pandemia do COVID-19 traz em seu DNA o todo. Nos faz olhar para o todo e para todos porque afeta a todos e o todo, até mesmo os dementes que insistem em um pretensa imunidade, seja por conta de um unção divina ou por pura ignorância.

No entanto, no mundo ficcional de Thanos, ,o processo de extermínio proposto visa  trazer equilíbrio aos mundos a partir de uma ética e de um senso de justiça rígidos.

Thanos prega o extermínio de 50% da população para que o equilíbrio possa se dar. Sem privilégios e sem direito de precedência. Um “extermínio justo” em que ninguém é poupado: nem ungidos, nem benzidos, nem abastados, nem jovens, nem poderosos, nem ignorantes.

A pandemia do COVID-19 também traz em seu DNA o povo. O COVID-19 emana do povo e é para o povo. Por isso nos leva a compreender, a partir do cenário catastrófico, que o pressuposto de um povo é o altruísmo e a colaboratividade. Por isso parece tão grotesco que governantes que mais parecem ter saídos do filme O Grande Ditador, de Charles Chaplin, permaneçam com devaneios imunitários.

Frear a economia global, parar de produzir, deixar de correr atrás do dinheiro e abrir mão de prazeres nos distancia de nossa essência fraterna. Conectados pela internet mas desconectados de nossas essências, esvai-se o senso de fraternidade. Por isso é necessário atender a restrição de liberdades em prol da vida do todo e, principalmente, da parcela vulnerável de nossa população.

Se olho apenas para meu umbigo ou para os umbigos daqueles que me são caros, concluo que os demais não me servem para nada. Logo,  se eu não me percebo como parte do todo eu não sinto empatia pelo todo.

Veja o Rio de Janeiro e seu “veranico de março”. Criaram uma nova interpretação de quarentena, lotando praias e se amontoando uns aos lado nos outros nas cálidas praias cariocas. Quanta empatia pelo próximo! Alia-se a isso a imagem burlesca de autoridades percorrendo praias lotadas e orientando as pessoas a irem para suas casas. Isso é surreal.

Thanos e sua ética de extermínio justo não poupa povo que transforma pandemia em motivo para praia, funk e cerveja. Tampouco poupará médicos, enfermeiros e tantos outros que irão colocar suas vidas a serviço dos cuidados e da cura daqueles que, pela ignorância, imprudência, ganância, crenças e poder, se permitiram infectar e propagar a doença.

Nem mesmo aqueles supostamente inocentes e sem pecados deixarão de adoecer. Pois a justiça e a ética de Thanos é implacável e não aceita negociações.

MÁRCIA SARUBBI LIPPMANN é doutoranda em direito pela Universidade do Minho (Portugal), mestre em ciência jurídica pela UNIVALI, professora, escritora e palestrante

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